Juventude às Ruas!

Fim do massacre ao povo palestino! Fim dos ataques do Estado de Israel à Faixa de Gaza! Palestina LIVRE!!

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Xingu Vive na aliança entre trabalhadores e a juventude combativa!

por Biro (Campinas) e Carol

A Juventude Às Ruas saúda a jovem estudante da ETECAP que nesta primeira semana de dezembro, ao receber premio de Jovem Cientista das mãos da presidente Dilma, realizou um corajoso ato de protesto contra a construção da usina Belo Monte, escrevendo sobre seu próprio corpo: “Xingu Vive”.
Este ato foi um exemplo para todos aqueles que se indignam com a construção desta obra faraônica, que tem gerado muitas polemicas nacionalmente. Esta obra faz parte de um projeto maior iniciado na ditadura militar, com o objetivo de avançar sobre os recursos naturais de nosso país sob o discurso de “desenvolvimento”. O projeto foi retomado com centralidade pelo governo Dilma, seguindo os passos de seu antecessor, Lula, como parte do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), motor do projeto de país lulista que tem por objetivo transformar o Brasil numa grande "potência mundial" às custas de trabalho ultra exploratório e precário dos trabalhadores e da degradação do meio que vivem, tornando-o mais insalubre e miserável, em prol dos lucros bilionários das grandes empresas de construção civil e transnacionais. 
Mesmo a mídia burguesa não esconde que esta obra afetará violentamente as condições ambientais e sociais da região. Além de deixar milhares de casas e terras férteis e florestadas inundadas, destruindo um  ambiente rico em biodiversidade e o meio de sobrevivência de milhares de famílias, o rio abaixo da represa secará, deixando a população indígena e local sem recursos para se alimentar e sobreviver. Estas comunidades têm se organizado contra a construção de Belo Monte e de outras barragens há muitos anos e o movimento é ignorado pelos governos federal e estaduais e entidades federais como IBAMA e FUNAI, que mantem carta branca para as instalações dos canteiros das obras não obstante toda a catástrofe que representará para a população local e regional. Este empreendimento está atraindo milhares de trabalhadores para a região, mas o que os esperam são salários miseráveis e condições péssimas de sobrevivência em meio às obras, o que repercutirá na precarização em outros locais, como indústrias e mineradoras. Este é o desenvolvimento que o capitalismo tem a nos oferecer, em que essa degradação ambiental, cuja exploração dos recursos é feita de forma predatória, é decorrente da exploração de uma classe sobre outra.
Essa exploração vai encontrando seus limites. Tempos atrás acompanhamos um conflito em Jirau, um campo de obras deste mesmo projeto, onde trabalhadores semi-escravizados atearam fogo em seus próprios alojamentos como forma de protesto, tamanho era o grau de exploração que sofriam. Ao longo do ano, vimos também greves e paralisações nos canteiros de obras para a Copa de 2014, obras estas que são parte também do projeto lulista de país. Em Belo Monte não é diferente. Os trabalhadores da construção desta usina já deflagraram inúmeras greves e cortaram importantes rodovias, como a transamazônica. Reivindicam melhores condições de trabalho e denunciam casos absurdos de precarização do trabalho, como distribuição de alimentos estragados e companheiros que adoecem em seus alojamentos. O governo,  junto à burocracia sindical, tem mantido a intransigência absoluta tentando desviar o conflito, demitindo os trabalhadores mais destacados e que participavam das comissões de negociação. Já são mais de 150 demitidos. Além das denuncias de assassinato dos líderes dos trabalhadores, população indígena e ribeirinha, que aumentam a cada dia.
Nesse contexto, nós, a juventude, devemos estar ao lado dos trabalhadores, do povo indigena, e das populações pobres atingidas por esses desastres planejados pela burguesia e o governo, combatendo o projeto de país do governo petista, a exploração da classe trabalhadora nos campos e nas cidades e a perseguição política de centenas de trabalhadores e estudantes, principalmente no Pará, por lutarem contra a construção desta usina. Devemos reivindicar e seguir o exemplo da luta dos estudantes chilenos que, no começo do ano, fizeram manifestações de milhares nas ruas e ocuparam escolas reivindicando a não construção das cinco barragens na região da Patagônia, por todos os problemas que, assim como Belo Monte, originariam no país. Não é pedindo aos governos e depositando neles esperanças que Belo Monte, assim como o Novo Código Florestal, serão barrados, pois o governo é o maior aliado da burguesia e do agronegócio. A luta deve ser independente dos deles e dos empresários, ao lado da juventude trabalhadora nas ruas!
Chega de energia e desenvolvimento sujos de sangue da população, dos trabalhadores e povos indígenas! Convocamos toda a juventude a combater a construção de Belo Monte e o projeto de país do governo, lutando lado a lado com os trabalhadores contra a precarização do trabalho e da vida. Xingú vive, e a juventude gritará até o fim da exploração e opressão do capitalismo.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Sobre o episódio entre um casal homossexual e o proprietário do Bar Fish



por Adriana Spinelli, Juventude às Ruas - Franca

Muito se falou sobre o episódio entre o casal homossexual e o proprietário do Bar Fish que ocorreu há pouco tempo em Franca. Entre o que foi falado houve, pelo menos, duas versões diferentes. A primeira versão dizia que o casal de rapazes se beijou no Bar e que em seguida foi abordado pelo proprietário que, de maneira grosseira, mandou que os dois se retirassem, isso aos gritos, expondo o casal a constrangimento - essa versão geralmente surgia acompanhada da defesa do casal, julgando homofóbica a atitude do dono do bar. Na segunda que, na maioria das vezes, era precedida de um alerta de que é preciso conhecer o que de fato aconteceu, porque houve, na verdade, mentiras e exageros por parte tanto dos garotos que sofreram o constrangimento quanto de quem levou a história pra frente, o casal estava se agarrando de maneira vulgar no bar, constrangendo os outros clientes, quando o dono do bar se aproximou educadamente para pedir que parassem, ao que eles responderam aos gritos e de maneira agressiva.

Pois bem, é preciso partir do que se tem de fato 1) o casal de garotos estava no bar, 2) o casal se beijou e 3) o proprietário do bar se aproximou para pedir que parassem, isso é consenso nas duas versões. A segunda versão frisa a forma como o dono do bar abordou os dois: educadamente. A ressalva educadamente procura formar a idéia de que é perfeitamente compreensível a atitude do dono do bar frente à postura dos garotos (não seria aceitável se ele fosse mal educado), porque os garotos estavam se agarrando de maneira vulgar. Ora, nada mais natural do que o dono de um bar impedir aquela situação constrangedora, “mesmo se fosse um casal heterossexual não poderiam se agarrar daquela forma em público”, defendem uns, partindo do mesmo princípio. Além disso, alguns clientes se mostraram incomodados com o fato nada normal de um casal gay se beijando em público, também nesse caso, nada mais compreensível do que o dono do bar tomar a atitude de impedir que aquilo continuasse, uma vez que os interesses de seus clientes são seus interesses, nada mais compreensível do que proteger seu negócio, natural.
Natural?

O que deve ser compreendido nessa situação, na verdade, é que o problema não reside nas diferenças entre as duas versões, o problema reside no que elas têm em comum. Nas duas o dono do bar se desloca até os dois garotos e os impede de uma forma ou de outra de continuarem a se beijar no local.
É preciso entender o significado dessa ação. O proprietário se desloca até o casal para pedir/ sugerir/mandar/ implorar/suplicar/exigir/impor que eles parem de se beijar, nesse contexto sua ação assume a qualidade de reprodução ideológica e é aí que reside o problema! É possível, portanto, discutir essa situação partindo dos fatos puros, sem os questionados saltos de qualidade (se ele gritou ou não).

 A violação da heteronormatividade como base do ato vulgar

O segundo elemento conflitante se encontra não na análise factual, mas na análise do discurso, no ponto em que se problematiza a questão da forma como se comportavam os garotos, com atitudes vulgares. Há uma reprodução ideológica, tanto no sentido de opressão a um casal homossexual, mas que também não se perderia caso fosse um casal heterossexual se beijando de maneira vulgar, há uma reprodução ideológica, portanto, de caráter mais profundo: a forma como se encara a sexualidade na sociedade.

Mas há ainda um problema grave nessa análise. A primeira coisa é que nunca ou raramente se ouve falar que um casal heterossexual foi expulso ou impedido de se beijar num local privado por estar se comportando de maneira vulgar, quase todas as vezes, no entanto, em que se ouve falar de um casal homossexual que entrou em conflito em algum lugar por estar se beijando, na maioria esmagadora das vezes em que se presencia uma discussão acerca de fatos como o do jovem casal, toca-se nesse ponto da vulgaridade. Em suma, aceita-se o agente da discriminação (na maioria das vezes o proprietário do local) com a justificativa de que o casal homossexual estaria em declarados atos libidinosos em público e ainda mais, na tentativa de concluir o raciocínio de maneira qualitativa e democrática, os propaladores desse discurso acrescentam que vulgaridade não se aceita de ninguém, NEM MESMO de casais heterossexuais. Estranho isso, estranho em primeiro lugar porque, como já foi dito, quase nunca se ouve falar que um casal heterossexual foi impedido de continuar se beijando porque "passava dos limites", em segundo lugar porque quase sempre é o que acontece no caso dos homossexuais, em terceiro, na articulação desses dois elementos: uma reprodução ideológica chave se aloja nesse discurso, e a compreensão disso é essencial para que se encare de maneira sincera o problema do preconceito – a idéia de que a homossexualidade é coisa de pessoas indecentes, vulgares, safadas ou qualquer adjetivo afim. O que é essencial, é entender porque esse dito "passar dos limites" é visto com tanta repulsa, não quando parte dos casais heterossexuais, com quem  isso não acontece nunca ou raramente.

Não é preciso dizer que esse discurso é perigoso, mas também não é difícil entender porque ele sempre brota nas situações de homofobia. Homossexuais praticam sexo, ou lidam com sua sexualidade de maneira idêntica aos heterossexuais, exploram as zonas erógenas de seus corpos da maneira que melhor lhes aprouver. A boca é uma zona erógena e é uma das únicas que, através do beijo,  podem ser exploradas em público, no entanto, somente por um casal heterossexual – dificilmente qualquer casal hetero ou homossexual se lançaria à aventura de expor em público mais do que o beijo, este é um código social (não que isto seja positivo) - faz parte das práticas cotidianas de um casal heterossexual, porém, explorar uma das únicas zonas erógenas permitidas em publico: a boca, e somente através do beijo, bem como andar de mãos dadas, abraçar-se, encostar um corpo no outro. A "safadeza gay" consiste, na verdade, em violar apenas um dos códigos sociais, a heteronormatividade. Somente isso explica o tal raciocínio que opõe a vulgaridade do casal homoafetivo à educação do proprietário. A educação do proprietário é eleita em detrimento do comportamento vulgar do casal justamente porque não viola nenhum código social, pratica deliberadamente, na verdade, a defesa da propriedade privada. 
 
A defesa da propriedade privada justifica a homofobia ou a repressão sexual desde que as reproduza educadamente, não é de se espantar que essa mesma defesa da propriedade não permita que um casal homossexual se beije, nem mesmo educadamente. Ainda reprodutor dessa mesma ideologia é o adjetivo que se opõe à educação do dono do bar, a vulgaridade, com a ressalva de que vulgaridade não se aceita NEM MESMO de heterossexuais.
 
A repressão sexual na sociedade de classes está a serviço da manutenção da propriedade privada.

O componente conservador na moral burguesa pretende mesmo conservar a propriedade privada, na medida em que corrobora as regras que regulam as relações dentro da família, da sociedade e do Estado. A quebra desse formato, cuja base é ameaçada também por práticas sexuais entre indivíduos do mesmo sexo, significa a quebra da estrutura que garante o gozo ilimitado da vida material de alguns, acompanhada da privação do gozo da vida material da maioria, mas que precisa, para se manter de pé, da miséria sexual da sociedade como um todo.

Qual a racionalidade existente em sentir-se incomodado ao ver pessoas se beijando deliciosamente em qualquer lugar, a não ser por motivos que se vinculem à defesa da família que tem base moral religiosa e automaticamente da propriedade privada e, portanto, da burguesia e de seu representante, o Estado? São perfeitamente naturais as relações: beijos, abraço e sexo. Quem será que verdadeiramente sente-se ofendido ao esbarrar na rua com um casal se agarrando intensamente no muro, deixando escapar gemidos, e se beijando descontroladamente, ou aviltado ao ver um homem beijando carinhosamente uma mulher na boca, ou ao ver um casal de homens de mãos dadas passando pela rua no fim da tarde, ou um casal de mulheres abraçadinhas cochichando no ouvido, a não ser aqueles cuja estrutura de caráter esteja formada para reforçar a moral da família e de uma sociedade milenarmente patriarcal? Somente isso justifica o fato de alguém se incomodar com terceiros que objetivamente em nada impedirão o livre transcurso de suas vidas.

 É irracional, no entanto, que duas pessoas não possam se beijar onde quer que seja, praticando sexualidade e afeto, saudáveis, práticas das quais compartilha todo o resto da humanidade, ou sua imensa maioria. O que dá ao dono de um bar ou a qualquer pessoa o direito de se sentir incomodado com essa cena? “Não é natural que vocês dois, sendo homens, se beijem numa sociedade heteronormativa, isso incomoda!”.  O que dá a ele esse “direito” é a normatividade sexual da sociedade de classes, sem a qual a mesma não sobreviveria.

 A moral deles e a nossa. O incômodo deles e o nosso!

Pois bem, se for para tratar de regras e exceções o que é que do ponto de vista de quem não tem propriedades, está incorreto? Incomoda que numa sociedade onde a regra é a expropriação da maioria dos produtores um proprietário que é uma exceção e, portanto, um privilegiado, possa defender a sua propriedade privada!

Desse ponto de vista, é perfeitamente compreensível que um indivíduo desses, que não tem propriedade alguma, considere um absurdo presenciar o motorista de um carro importado, cujo nome da marca desconhece e tampouco consegue pronunciar, penetrando a garagem de uma mansão toda adornada de cerca elétrica e alarmes de segurança, quando esse mesmo motorista tem contratada uma empregada doméstica que sobrevive com um salário irrisório em que metade é gasto no pagamento do aluguel de sua casa para a qual ela segue ao final de todos os dias de trabalho duro, a fim de descansar seu corpo, num ônibus lotado, com vários estudantes e trabalhadores, nenhum deles tendo posse nem mesmo de seu assento no ônibus, que, repetindo, tem a liberdade para seguir lotado, com o preço da passagem pela hora da morte. Para essas pessoas que nada tem, nem negócio, nem carro, nem bar, nem propriedade alguma, em nada interfere a livre expressão afetiva ou sexual de um casal, o que interfere na vida dessas pessoas objetivamente é o acúmulo de capital, os monopólios, oligopólios, a concentração de renda e de terras, isso as impede do gozo livre e pleno de suas vidas, nada mais.

Esse raciocínio, desvinculado da ideologia da classe dominante faz parte da lógica da classe trabalhadora, mas é inconcebível na semântica burguesa cujo axioma da propriedade privada, não faz, todavia, nenhum sentido, a não ser como tal e para quem interessa.

Entende-se como natural a atitude de um proprietário de bar de defender sua propriedade privada. E não se entende como natural a livre expressão do afeto e da sexualidade. Porque os corpos de todas as pessoas, além da força de trabalho objetivamente no caso da classe trabalhadora, precisam estar a serviço de quem tem interesses a defender, mesmo ao custo da liberdade sexual dos jovens, principalmente das mulheres, mais ainda, dxs homossexuais, e de todas as pessoas. Nesse sentido se pode constranger a expressão do prazer seja ele qual for, sob o pretexto irracional da defesa da propriedade, aliada à moral burguesa, da qual só se beneficia quem tem um negócio que gera lucro, um bar, o dono de uma mansão com quatro carros na garagem, um padre ou um pastor de igreja.

A questão são os interesses de quem não tem propriedade a defender. Não tem interesses dentro da sociedade capitalista, não cobra dízimo de ninguém ou mais grave ainda, além de tudo isso não se encaixa nos padrões heteronormativos. Que interesse têm esses em podar a expressão de sua própria sexualidade, de seus próprios corpos, o seu prazer, a sua liberdade sendo que não participam dos lucros gerados por essa moral?  Essa ideologia protege os interesses de uma minoria! A sexualidade e sua livre expressão, no entanto, são fruto da própria condição de ser humano, dotado de corpo físico. Corpo esse que irracionalmente, ninguém impede que se esgote de tanto trabalhar, mas que não pode desfrutar de suas expressões de sexualidade, cujo prazer e a realização plena são essenciais para a saúde mental e física.

A repressão sexual como base da ideologia dominante e a serviço da manutenção do status quo

A repressão do sexo e da sexualidade ocupam lugar estratégico na ideologia dominante, está a serviço da classe dominante, está a serviço do capital. Garante a formatação da família, a opressão da mulher, o machismo e, nesse sentido, a manutenção desse estado de coisas. A irracionalidade consiste em que uma pequena parte da sociedade detém os meios de produção, e a maioria da população trabalha gerando mais valia para os proprietários, que tem a favor de si toda a sua ideologia, que justifica a opressão aos homossexuais desde que seja educadamente e que coloca como vergonhosa a expressão da sexualidade e do prazer. Estabelece locais e horários onde se possa transar, expressar afeto, carinhos e carícias. Mas não estabelece horário nem local para a livre expressão da ideologia dominante, que oprime, reprime, machuca e constrange.

Divide, categoriza e escraviza os corpos, estabelece papéis a serem cumpridos. Relega à mulher a posição de frágil, sentimental, comportada, recatada, submissa, subserviente, mãe e cristã em oposição ao homem, macho provedor, viril, praticante incondicional de sexo (desde que com mulheres), separa os heterossexuais - cuja expressão livre do amor jamais será contestada - dos homossexuais, cuja presença sempre incomoda, não por ser diferente, mas por contestar a lógica reprodutiva burguesa, cristã e familiar, um dos pilares da propriedade privada. Divide quais expressões sexuais podem ocorrer em publico, abafa a sexualidade e o prazer, estabelece hora, local e regras pra tudo, exceto para a defesa a qualquer preço da sagrada propriedade privada.

A sociedade capitalista precisa apontar as diferenças como nocivas justamente no ponto em que elas são inócuas, na sexualidade, para assim limpar a cara das diferenças econômicas que, essas sim, provocam sofrimento, são mortais, vulgares e indecentes. Assegura-se que o capital sobreviva e se reproduza sobre corpos e mentes doentes, justamente porque doentes são fracos. A doença consiste em assumir papéis artificiais para sustentar uma pretensa imagem sem a qual, na sociedade burguesa, acredita-se que não se pode viver.

É necessário uma juventude subversiva, questionadora e transformadora. É necessária a construção de uma juventude revolucionária!

Até quando, é a pergunta, a juventude assimilará a condição clandestina de se relacionar entre pessoas, em dupla, do mesmo sexo, e somente escondidos, no escuro, nos porões da sociedade burguesa, enjaulados como bichos perigosos a serem domesticados, reprimidos como se fossem ilegais? Algum ser humano é ilegal? Aceita-se a condição de repressão dos corpos para garantir os direitos de quem? Do dono de um bar? Dos proprietários? Para os jovens estudantes e trabalhadores a lógica burguesa é vazia de sentido, não se justifica.

Estaria esse proprietário interessado em defender os direitos de alguém que não tem posses também? Não há reciprocidade. Ao que parece a maioria de nós continua defendendo os interesses da propriedade privada mesmo não tendo nenhum direito sobre ela. A lógica dos proprietários, no entanto, segue um caminho inverso, querem nos tirar o direito de decidir sobre a única coisa que temos: nossos corpos! Não, nós da juventude às ruas não compreendemos, não consideramos natural e repudiamos a atitude tomada pelo dono do bar, não porque ele foi grosseiro e mal educado, mas mesmo pela sua maneira delicada e educada de maltratar.

Entendemos e reivindicamos, nesse sentido, a atitude de todos os que conscientemente se posicionem e denunciem publicamente situações como essa. Atitude que reflete uma condição objetiva atual de toda a juventude no mundo inteiro.  Uma juventude cansada do moralismo doentio da burguesia, que não está mais disposta a abaixar a cabeça pra preconceito. Juventude não domesticada. Que não abaixa a cabeça pra homofobia! Disposta a tomar pela força os fuzis morais apontadas contra a nossa liberdade! Juventude que investiga as causas e os interesses nefastos da manutenção dessa moral absurda sob a qual padecem nossos corpos e nossas mentes!

ABAIXO A MORAL BURGUESA!
ABAIXO A HOMOFOBIA! ABAIXO O PRECONCEITO!
ABAIXO A PROPRIEDADE PRIVADA!
VIVA A SEXUALIDADE PLENA! VIVA O LIVRE PRAZER!
VIVA A LIBERDADE DOS CORPOS E DAS MENTES!
VIVA A LIBERDADE DE TODOS OS SERES HUMANOS!
 
                        POR UMA JUVENTUDE COMBATIVA, CLASSISTA E REVOLUCIONÁRIA!
                                                                   POR UMA JUVENTUDE ÀS RUAS! 

Sobre a eliminação dos 6 estudantes da USP

Por Izabel Gogone


São escandalosas as “eliminações” de 6 estudantes da USP que lutam por permanência estudantil, justificadas pela Reitoria pela ocupação do bloco G, onde ficava o Coseas (Coordenadoria de Assistência Social), em março de 2010, hoje denominado “Moradia Retomada”. As declarações da USP e da mídia em geral tendem a reverter a eliminação desses estudantes e transformá-la em “cumprimento da lei”, numa justa punição sem fins políticos. Entretanto, essa punição  é respaldada num Estatuto da USP criado em 1972 em meio a Ditadura Militar, e que trata como indicisplina grave passíveis de punição "promover manifestaçõesde caráter político-partidário" e "apoiar ausências coletiva aos trabalhos escolares"  . Não se trata de fazer "cumprir a ordem" essas e outras perseguições inserem-se num contexto de colocar a USP a serviço de ser cada  vez mais elitista e voltada para os interesses do mercado. Não só, também se inserem no contexto de acirramento mundial da luta de classes (vide levantes na Grécia, Tunísia, Egito, Espanha, Inglaterra, Estados Unidos, Chile dentre outros, todos caracterizados pela massiva participação da juventude). Trata-se, portanto, sim, de uma via de repressão política e a história recente da USP e do CRUSP podem esclarecer com mais segurança esse fato. Vejamos.
O CRUSP foi uma conquista estudantil histórica na qual o método de luta da ocupação teve sempre importante papel. Construído na década de 60, sua função original era abrigar atletas dos jogos Pan-Americanos e, prometia-se, posteriormente tornar-se via da permanência estudantil. Como a promessa não foi cumprida, de 64 a 68 aconteceram sucessivas ocupações que o transformaram em moradia e num importante espaço de resistência política do Movimento Estudantil contra a Ditadura Militar reunindo centenas de militantes de esquerda. Alguns dias após o decreto do AI-5 – que marcou a fase mais truculenta e assassina da ditadura militar brasileira –, o CRUSP foi invadido pelo Exército, expulsando e prendendo centenas de militantes muitos dos quais fazem parte da história dos mortos do regime. Isso aconteceu em 17/12/1968, exatos 43 anos antes da publicação das eliminações desses seis estudantes. Mais do que uma ironia histórica, isso só demonstra o quanto as raízes do autoritarismo ainda estão profundas no estado brasileiro e começam a brotar nos nichos de maior contestação política.
A partir de 1979, quando se inicia a abertura política do regime, reiniciaram-se as ocupações que possibilitaram a utilização do CRUSP como moradia estudantil ATÉ HOJE. Outras várias ocupações aconteceram (a história que a USP quer esquecer pode ser consultada em sites como http://ocupauspcontrarepressao.blogspot.com/2011/10/moradia-retomada-usp-1-ano-de.html) até que, em março de 2010, estudantes ocuparam o térreo do bloco G. Surgia a Moradia Retomada. O objetivo da ocupação era retomar este espaço conquistado com muita luta em meio a repressão militar, que foi arbitrariamente invadido pela COSEAS, que cumpre um papel de perseguição e vigilância contra os estudantes e para reivindicar mais vagas para permanência estudantil e disponibilizar, imediatamente, o espaço para essa finalidade. Um ano depois, residem na ocupação cerca de 40 pessoas que resistem contra a pressão política e jurídica (reintegração de posse) que a reitoria impõe.
Apesar de ganhar o maior destaque da mídia, as “eliminações”  fazem parte de uma histórica lista de perseguições  da Reitoria à ativistas e lutadores que vão desde a demissão do dirigente do SINTUSP (Sindicato dos Trabalhadores da USP), Claudionor Brandão, em dezembro de 2008, até a polêmica assinatura do Convênio com a PM e a reintegração cinematográfica da reitoria que culminou com a prisão de 73 estudantes e trabalhadores neste semestre, além de vários processos administrativos contra os lutadores por conta de greves e ocupações anteriores. Essas são táticas para calar o movimento estudantil e de trabalhadores, impor o medo e o isolamento político dos que lutam.
Há muito mais para se falar: os critérios injustos de seleção de moradores do CRUSP, as imposições para não se perder a vaga, os abusos machistas que são de conhecimento do Coseas que nada faz, a espionagem de moradores, a punição de professores e trabalhadores que denunciam irregularidades na universidade, o embasamento legal das eliminações, que se pauta em normas da época da ditadura.
Hoje, os estudantes da USP têm sobre os ombros o peso de uma universidade construída no individualismo meritocrático de “excelência”, em que lutar significa, como disse um dos “eliminados”: “O reitor, em uma decisão, acaba com a minha vida acadêmica e profissional.” E, obviamente, essa decisão tem o intuito de “dar o exemplo” dentro e fora da USP. Por isso mesmo temos um papel histórico de reverter essa decisão, bem como as outras medidas de repressão aos que lutam, como tática fundamental de fortalecer o movimento estudantil e de trabalhadores. Permanecer inerte, neste momento, significa deitar por terra todas as conquistas democráticas alcançadas por lutadores de antes e de hoje, bem como assumir que a usp seja e continue a ser uma universidade elitista, racista e excludente.


PELA REVOGAÇÃO  IMEDIATA DAS 6 “ELIMINAÇÕES”!
PELA REVOGAÇÃO DE TODOS OS PROCESSOS, ADMINISTRATIVOS E CRIMINAIS, CONTRA OS 73 ESTUDANTES E TRABALHADORES PRESOS!
PELA REVOGAÇÃO DE TODOS OS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E CRIMINAIS CONTRA ESTUDANTES E TRABALHADORES! 
FORA PM DA USP, DOS MORROS E FAVELAS!
PELO FIM DO VESTIBULAR E ESTATIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES PRIVADAS!






Sobre as eliminação dos 6 estudantes da USP

Por Izabel Gogone



São escandalosas as “eliminações” de 6 estudantes da USP que lutam por permanência estudantil, justificadas pela Reitoria pela ocupação do bloco G, onde ficava o Coseas (Coordenadoria de Assistência Social), em março de 2010, hoje denominado “Moradia Retomada”. As declarações da USP e da mídia em geral tendem a reverter a eliminação desses estudantes e transformá-la em “cumprimento da lei”, numa justa punição sem fins políticos. Entretanto, essa punição  é respaldada num Estatuto da USP criado em 1972 em meio a Ditadura Militar, e que trata como indicisplina grave passíveis de punição "promover manifestaçõesde caráter político-partidário" e "apoiar ausências coletiva aos trabalhos escolares"  . Não se trata de fazer "cumprir a ordem" essas e outras perseguições inserem-se num contexto de colocar a USP a serviço de ser cada  vez mais elitista e voltada para os interesses do mercado. Não só, também se inserem no contexto de acirramento mundial da luta de classes (vide levantes na Grécia, Tunísia, Egito, Espanha, Inglaterra, Estados Unidos, Chile dentre outros, todos caracterizados pela massiva participação da juventude). Trata-se, portanto, sim, de uma via de repressão política e a história recente da USP e do CRUSP podem esclarecer com mais segurança esse fato. Vejamos.

O CRUSP foi uma conquista estudantil histórica na qual o método de luta da ocupação teve sempre importante papel. Construído na década de 60, sua função original era abrigar atletas dos jogos Pan-Americanos e, prometia-se, posteriormente tornar-se via da permanência estudantil. Como a promessa não foi cumprida, de 64 a 68 aconteceram sucessivas ocupações que o transformaram em moradia e num importante espaço de resistência política do Movimento Estudantil contra a Ditadura Militar reunindo centenas de militantes de esquerda. Alguns dias após o decreto do AI-5 – que marcou a fase mais truculenta e assassina da ditadura militar brasileira – o CRUSP foi invadido pelo Exército, expulsando e prendendo centenas de militantes muitos dos quais fazem parte da história dos mortos do regime. Isso aconteceu em 17/12/1968, exatos 43 anos antes da publicação das eliminações desses seis estudantes. Mais do que uma ironia histórica, isso só demonstra o quanto as raízes do autoritarismo ainda estão profundas no estado brasileiro e começam a brotar nos nichos de maior contestação política.

A partir de 1979, quando se inicia a abertura política do regime, reiniciaram-se as ocupações que possibilitaram a utilização do CRUSP como moradia estudantil ATÉ HOJE. Outras várias ocupações aconteceram (a história que a USP quer esquecer pode ser consultada em sites como http://ocupauspcontrarepressao.blogspot.com/2011/10/moradia-retomada-usp-1-ano-de.html) até que, em março de 2010, estudantes ocuparam o térreo do bloco G. Surgia a Moradia Retomada. O objetivo da ocupação era retomar este espaço conquistado com muita luta em meio a repressão militar, que foi arbitrariamente invadido pela COSEAS, que cumpre um papel de perseguição e vigilância contra os estudantes e para reivindicar mais vagas para permanência estudantil e disponibilizar, imediatamente, o espaço para essa finalidade. Um ano depois, residem na ocupação cerca de 40 pessoas que resistem contra a pressão política e jurídica (reintegração de posse) que a reitoria impõe.

Apesar de ganhar o maior destaque da mídia, as “eliminações” fazem parte de uma histórica lista de perseguições  da Reitoria à ativistas e lutadores que vão desde a demissão do dirigente do SINTUSP (Sindicato dos Trabalhadores da USP), Claudionor Brandão, em dezembro de 2008, até a polêmica assinatura do Convênio com a PM e a reintegração cinematográfica da reitoria que culminou com a prisão de 73 estudantes e trabalhadores neste semestre, além de vários processos administrativos contra os lutadores por conta de greves e ocupações anteriores. Essas são táticas para calar o movimento estudantil e de trabalhadores, impor o medo e o isolamento político dos que lutam.

Há muito mais para se falar: os critérios injustos de seleção de moradores do CRUSP, as imposições para não se perder a vaga, os abusos machistas que são de conhecimento do Coseas que nada faz, a espionagem de moradores, a punição de professores e trabalhadores que denunciam irregularidades na universidade, o embasamento legal das eliminações, que se pauta em normas da época da ditadura.

Hoje, os estudantes da USP têm sobre os ombros o peso de uma universidade construída no individualismo meritocrático de “excelência”, em que lutar significa, como disse um dos “eliminados”: “O reitor, em uma decisão, acaba com a minha vida acadêmica e profissional.” E, obviamente, essa decisão tem o intuito de “dar o exemplo” dentro e fora da USP. Por isso mesmo temos um papel histórico de reverter essa decisão, bem como as outras medidas de repressão aos que lutam, como tática fundamental de fortalecer o movimento estudantil e de trabalhadores. Permanecer inerte, neste momento, significa deitar por terra todas as conquistas democráticas alcançadas por lutadores de antes e de hoje, bem como assumir que a usp seja e continue a ser uma universidade elitista, racista e excludente.



PELA REVOGAÇÃO  IMEDIATA DAS 6 “ELIMINAÇÕES”!
PELA REVOGAÇÃO DE TODOS OS PROCESSOS, ADMINISTRATIVOS E CRIMINAIS, CONTRA OS 73 ESTUDANTES E TRABALHADORES PRESOS!
RETIRADA DE TODOS OS PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E CRIMINAIS CONTRA ESTUDANTES E TRABALHADORES! 
FORA PM DA USP, DOS MORROS E FAVELAS!
PELO FIM DO VESTIBULAR E ESTATIZAÇÃO DAS UNIVERSIDADES PRIVADAS!

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Surrealismo e trotskismo: os caminhos cruzados antes do Manifesto da FIARI (1938)

por Thyago Villela






Somos especialistas da Revolta. Não há um meio de ação que não sejamos capazes de empregar, se necessário...
O surrealismo não é uma forma poética.
É um brado do espírito que se volta para si mesmo e está nitidamente decidido a romper desesperadamente seus entraves.
E se necessário com martelos materiais.

(Declaração surrealista de 27 de janeiro de 1925)
A análise do movimento surrealista, se encarada mediante uma perspectiva retrospectiva superficial, pode desembocar facilmente na simples conclusão de que o devir natural do grupo, e sua realização última enquanto tal, repousa em sua articulação ao materialismo dialético – este enquanto guia de ação capaz de abarcar e enriquecer todas as aspirações dos poetas e artistas plásticos surrealistas de então. O Manifesto da FIARI (escrito por Leon Trotsky e André Breton em 1938, na cidade de Coyocán, México) é utilizado largamente para exemplificar os laços firmados entre ambos, muitas vezes no sentido de simplesmente enaltecer os surrealistas pela adesão ao léxico e à prática revolucionária (e muitos destes enaltecedores tampouco conhecem o surrealismo como prática artística), e raras vezes no sentido de enaltecer uma síntese da série de contradições que se abriram na esquerda artística e política do começo do século XX. A esta primeira leitura mistificadora e de caráter teleológico, que faz da história do grupo surrealista uma límpida história linear e sem tensões, proporemos uma breve abordagem do movimento que procura, ao contrário, apreender as contradições intestinas ao mesmo, bem como reconstruir os momentos de aproximação e distanciamento deste da esquerda organizada e, por fim, no que cabe aos desígnios deste artigo, do trotskismo. A questão chave aqui é apontar qual a relação que o surrealismo manteve com o trotskismo antes do tão citado Manifesto do México.
Em um primeiro momento, cabe pontuar que o surrealismo, enquanto desenvolvimento de uma ruptura no interior do movimento Dadá provocada por discordâncias quanto à filosofia e prática meramente destrutiva dos últimos, segundo os dissidentes1, não se desenrola para o campo da prática política imediata, ou para um ideário de “politização da estética”, como proporia posteriormente Walter Benjamin; mas, antes, para a radicalização de procedimentos artísticos já iniciados no dadaísmo, incorporação e criação de novas estratégias criativas e alargamento da crítica Dadá até uma positivação da mesma, ou seja, até um rompimento com seu imaginário niilista em prol de uma prática vital que combatesse o homem do pós-guerra e suas misérias e, centralmente, o campo moral da classe burguesa em sua racionalização mercantil. Se o dadaísmo não fora senão “uma maneira de sentar-se”, como escreveu André Breton em 1923, é possível que o mesmo poeta analisasse o “período heróico do surrealismo” (entre os anos 1923-1925), conforme denominado por Maurice Nadeau, como expressão da mesma postura de relaxamento, em seu sentido estritamente político.2
É fato que a Revolução Russa, ainda não degenerada, não fora objeto de exaltação por parte do grupo. Ao contrário: entendida enquanto uma mera transposição de poderes, cuja única tônica repousava no aspecto econômico, não merecia destaque para os mesmos, que almejavam uma Revolução completa, do espírito humano, que passaria a incorporar o aspecto inconsciente da vida, a supra-realidade. Lê-se, por exemplo, em La Revolutión Surrealiste no. 4:

Não existe revolução total, há unicamente a Revolução perpétua, vida verdadeira, como o amor, deslumbrante a todo momento. Não existe ordem revolucionária, há apenas desordem e loucura. A guerra da liberdade deve ser conduzida com cólera e conduzida sem cessar por todos que não aceitam...
(Apud NADEAU, 1985, p. 76)

A idéia sobre uma Revolução social, desta maneira, passava por matizes idealistas, no sentido de que adquiria o aspecto de uma revolta sem consciência, um valor transcendente, sem alcance, perpétua em seu sentido longínquo, inalcançável.3 A “criação de um mito coletivo”, idéia cara ao grupo, era entendida enquanto desvinculada e às vezes antagônica com a proposição de uma insurreição armada acaudilhada pelo proletariado para a tomada de poder das mãos da burguesia. Os intensos debates promovidos pelos surrealistas na época, tais quais se o surrealismo consistiria em si uma revolução ou não, foram acelerados pelos rumos da situação internacional, de maior dinamização da luta de classes. A Guerra do Marrocos assume importância central no giro do movimento às questões mais propriamente políticas, a partir de uma aproximação e colaboração do grupo com a revista Clarté e seus editores.4
É deste período uma proclamação inteiramente nova aos surrealistas, que marca a passagem de uma concepção mais abstrata do sentido de uma Revolução para a de uma subversão do modo de vida fincada em bases materiais: “Não somos utopistas: esta Revolução não a concebemos senão sob sua forma social.” (NADEAU, 1985, p. 83).5 Não se trata mais de uma “revolução do espírito” sem mudar “o que quer que seja na ordem física e aparente das coisas” (Idem, ibidem). É significativo que no mesmo período André Breton tenha lido Lenin, escrito por Trotsky, o que se faz notar neste trecho, por exemplo, do Manifesto lançado pelo grupo em 1925, A Revolução primeiramente e sempre:

Há mais de um século a dignidade humana é rebaixada à categoria de valor de troca. Já é injusto, é monstruoso mesmo, que quem nada possui seja escravizado por quem possui, mas quando essa opressão ultrapassa o quadro de um simples salário a pagar e toma, por exemplo, a forma de uma escravidão que as altas finanças internacionais fazem incidir sobre os povos, é uma iniqüidade que nenhum massacre poderá expiar.
(Apud NADEAU, 1985, p. 83)

A passagem da Revolução de valor transcendente até a adesão dos surrealistas ao princípio do materialismo dialético marca o “período raciocinante” do grupo, conforme nomeado pelo próprio Breton. Interessa notar que, enquanto a maior parcela da intelectualidade francesa aderiu à consigna de “defesa da pátria” mediante a Guerra do Marrocos, os surrealistas se alinharam prontamente em favor dos insurgentes marroquinos, aproximando-se deste modo do Partido Comunista Francês e de seus intelectuais. A filiação do grupo ao PCF dá-se paulatinamente, e até 1927, quase todos os seus membros remanescentes já eram militantes. No mesmo ano, entretanto, em função da crescente stalinização das fileiras do Partido, boa parte dos surrealistas rompe com seu aparato burocrático.6


A expressão mais significativa e mais citada deste desenvolvimento do ideário surrealista, feito mediante uma série de conflitos internos e distanciamentos e aproximações de outros artistas do grupo inicial, é o Segundo Manifesto do Surrealismo, que data de 1929. Neste, Breton declara abertamente a adesão do grupo ao materialismo dialético, bem como empreende críticas ao PCF.7 Cabe comentar também que é neste manifesto que pela primeira vez surge no interior do grupo a definição de arte enquanto processo de sublimação, definição esta que reaparecerá no Manifesto da FIARI, de 1938, redigido com Trotsky. Um elemento seu pouco comentado, no entanto, diz respeito à qualidade desta adesão ao materialismo. Escreveu Breton:

Como admitir que o método dialético só possa aplicar-se validamente à solução de problemas sociais? A ambição maior do surrealismo é fornecer-lhe possibilidades de aplicação de modo algum concorrentes no domínio consciente mais imediato. Em que pese a certos revolucionários de espírito acanhado, não compreendo por que nos absteríamos de colocar, desde que o abordássemos do mesmo ponto de vista do qual eles – e também nós – o fazem, que é o da Revolução, os problemas do amor, do sonho, da loucura, da arte e da religião.
(BRETON, 2001, p. 169)
O caráter afirmativo do grupo se manifesta, ao que nos parece, de modo a subordinar o materialismo dialético à Revolução Surrealista desejada, e não o contrário. A Revolução Comunista, desta maneira, e a luta por sua realização, vem como ampliação do ideário surrealista, e não enquanto propósito maior ao qual o surrealismo comporia. Retomando-se a idéia de “resolução dos problemas fundamentais do homem”, presente no Primeiro Manifesto (de 1924), os surrealistas aderem ao marxismo com o intuito de, primeiramente resolver os fundamentos materiais da existência, para assim abrirem caminho para a verdadeira revolução do espírito em sua totalidade. Eis uma das chaves para a compreensão da defesa incessante que farão acerca da necessária autonomia de suas atividades artísticas, cada vez mais cerceadas pela burocracia que se cristalizava no PCF:

(...) existe também a experiência surrealista. Ela já deu resultados e em nada se opõe à Revolução. Segundo Breton, até ultrapassa por sua amplitude a estreita especialização do econômico e do social e não seria pequeno o risco se se confundisse com ela, se se limitasse a ela. Aqueles que quisessem considerá-la como um simples anexo da ação revolucionária se enganariam, e Breton previne seus amigos políticos a não esperarem de sua parte nem desaprovação dessa ação, nem renúncia. É útil, é necessário que a experiência surrealista prossiga seu caminho.
(NADEAU, 1985, p. 87)



Em confluência com o desenvolvimento das idéias do grupo, acerca da autonomia artística frente aos partidos, percebe-se um notório paralelismo nas elaborações de Leon Trotsky sobre o tema, contraposto, neste arcabouço teórico, às teorias sobre a cultura proletária e a arte proletária, embriões da futura política soviética de coerção à produção artística e eliminação física dos artistas.8 Ao abuso cometido nestas linhas, com a imediata e mecânica associação entre o campo da economia e da cultura, e uma mesma política estatal e partidária que deveria se guiar igualmente nos dois sentidos, Leon Trotsky oporá a mais ampla liberdade à criação artística: se reivindica, por um lado, a economia planificada, reivindica a anarquia criativa e intelectual. O revolucionário, que desde 1923, ironizava e criticava a pobreza das teorizações sobre a cultura proletária, no sentido da impossibilidade histórica da mesma e da contradição que mantinha com a teoria marxista9, se colocará até sua morte, em 1940, contra a política cultural desenvolvida no interior da Rússia e assumida pelos demais Partidos Comunistas a partir da Internacional Comunista. Escreverá em 1923:
No fim da guerra civil, quando abordávamos uma nova fase da nossa atividade, a tentativa de criar uma “doutrina militar proletária” foi a expressão mais clara e mais gritante da incompreensão das tarefas da nova época. Os orgulhosos projetos que visam criar uma “cultura proletária” em laboratório partem da mesma incompreensão. Em meio à busca pela pedra filosofal, o nosso desespero perante nosso atraso une-se a uma crença no milagre, que é ela própria um sinal desse atraso. Mas não temos nenhuma razão para nos desesperar; é mais do que tempo de nos libertarmos dessa crença em milagres, dessas práticas pueris de curandeiros, do gênero da “cultura proletária” ou da doutrina militar proletária. Para fortalecer a ditadura do proletariado é preciso desenvolver um militantismo cultural cotidiano, o único que pode garantir um conteúdo socialista para as conquistas fundamentais da revolução. Quem não compreendeu isso, representa um papel reacionário na evolução do pensamento e do trabalho do partido.
(TROTSKY, 2009)10
Na mesma trilha, publicará no ano seguinte Literatura e Revolução, obra lapidar no combate à coerção da produção artística e a mencionada tentativa de se “criar em laboratório” uma nova cultura de classe:

Isso quer dizer que o Partido, contradizendo seus princípios, adota uma posição eclética nos domínios da arte? O argumento que parece fulminante é meramente infantil. O marxismo oferece diversas possibilidades: avalia o desenvolvimento da nova arte, acompanha todas as suas mudanças e variações por meio da crítica, encoraja as correntes progressistas, porém não faz mais que isso. A arte deve abrir por si mesma seu próprio caminho. Os métodos do marxismo não são os mesmos da arte. (...) A arte não é um domínio que se chame o Partido a comandar.
(TROTSKY, 2007, p. 173 - grifos nossos)

Embora Literatura e Revolução só tenha sido publicado na França em 1964 (pela tradução do também primeiro historiador do surrealismo: Maurice Nadeau), a série de debates travados no período pela intelectualidade francesa indica que suas teses centrais, se não lidas, já haviam sido apreendidas e incorporadas nas discussões (GOUJON, 1994). O alinhamento entre o grupo e as idéias de Trotsky, entretanto, não se dá apenas no que toca mais diretamente o campo da arte. O próprio estreitamento dos surrealistas à Clarté dá-se mediante a reivindicação, em primeiro lugar, dos nomes de Vladimir Lenin e de Trotsky, enquanto seu continuador revolucionário. Em 11 de março de 1929, por exemplo, Breton chama uma reunião do grupo com o intuito de discutir e examinar criticamente a “sorte dada recentemente a Leão Trotski” (NADEAU, 1985, p. 115), referindo-se à expulsão do revolucionário da Rússia pela burocracia soviética, ou ainda, a título de outro exemplo, a já mencionada leitura apaixonada de Breton sobre o livro Lenin, sobre o qual comentará, em 1925:

No plano moral onde resolvemos nos colocar, está claro que um homem como Lenin é absolutamente inatacável. E à objeção de que, conforme este livro, Lênin é um tipo e os ‘tipos não são homens’, pergunto: Qual destes novos bárbaros sofistas terá a ousadia de sustentar que há algo a reprovar nas apreciações gerais emitidas ocasionalmente por Trotski sobre os outros e sobre ele mesmo?
(Apud FACIOLI, 1985, p. 76)

Poderíamos citar ainda o manifesto Planeta sem Passaporte, de 1934, no qual o grupo coloca-se novamente em defesa do dirigente do exército vermelho e contrário à negativa de permissão de asilo político da França ao mesmo; ou ainda o conhecido Manifesto da FIARI, escrito no México em 1938 por Breton e Trotsky – expressão mais bem acabada dos esforços de ambos os revolucionários no campo de uma elaboração programática referente às artes (“toda a licença em arte”).
Importa notar, por fim, que, mesmo durante o período de ingresso do grupo no PCF, os surrealistas sempre foram marginalizados no interior do partido em função de suas atividades artísticas, entendidos enquanto grupo de matriz pequeno-burguesa, sem disciplina revolucionária, etc. Os surrealistas parecem se preparar a todo o momento para um ataque dos demais militantes e da comissão editorial da Clarté, de onde resulta a série de cartas, tomadas de posição e intimações que formam a brochura Au Grand Jour, de 1927:

Por que, perguntam a Marcel Fourrier, somos utilizados apenas para uma “tarefa literária”? É dessa maneira que compreendeis a especialização? Será que servimos somente para amenizar as áridas páginas políticas de Clarté? Por outro lado, por que vos mostrais tão tímido a tomar a nossa defesa? Se até nós temos de ser defendidos contra a estreiteza de espírito de militantes que não apreciam a mensagem de libertação humana que Sade e Lautréamount lhes transmitiram, por que não nos defendeis aberta e responsavelmente, e com conhecimento de causa, já que de maneira nenhuma vos somos desconhecidos?
(Apud NADEAU, 1985, P. 97)


A linha política do PCF no período, ainda que não orientada tal qual depois de 1934, para a perseguição dos artistas de vanguarda que não tivessem aderido à estética estatal do realismo-socialista, já poderia conter elementos de perseguição neste sentido, informação da qual se carece de fontes.
A série de tensões, entretanto, que permearam o desenvolvimento do movimento surrealista em contato íntimo com a intelligentsia comunista francesa já nos remete a uma perseguição, ainda que informal, dos quadros do partido a estes artistas, como colocado acima. O trotskismo, neste sentido, oferecia uma possibilidade alternativa, ao menos teoricamente – na medida em que muitos dos quadros e dirigentes trotskistas (incluso o ex-surrealista Pierre Naville11) perseguirão artistas – com relação à articulação arte e política. A revisão historiográfica crítica sobre tais processos é tarefa premente para os revolucionários, no sentido de “escovar a contrapelo” a relação mantida entre o trotskismo e as vanguardas artísticas, bem como o debruçar sobre as elaborações de Leon Trotsky sobre o tema, e da necessária independência artística para a revolução, não apenas tática, mas estrategicamente.





Referências
ARTAUD, Antonin. Linguagem e vida. São Paulo: Perspectiva, 2004.
BRETON, André. Manifestos do surrealismo.Rio de Janeiro: Nau, 2001.
FACIOLI, Valentim (Org.). Breton-Trotsky: Por uma arte revolucionária independente. São Paulo: Paz e Terra; Cemap, 1985. 218 p.
COGGIOLA, Osvaldo (Org.). Trotsky hoje. São Paulo: Ensaio, 1994. p. 203-216.
GOUJON, Gerard. Trotsky e a “literatura proletária” na França. In: COGGIOLA, Osvaldo (Org.). Trotsky hoje. São Paulo: Ensaio, 1994. p.193-202.
KLINGSOHR-LEROY, Cathrin. Uma nova declaração dos direitos do homem. In: Surrealismo. Singapura: Taschen, 2007.
LOWY, Michael. Estrela da manhã: surrealismo e marxismo. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.
NADEAU, Maurice. História do surrealismo. São Paulo : Perspectiva, 1985. 
TROTSKY, Leon. Literatura e revolução. Rio de Janeiro : Zahar, 2007. 
______________. Questões do modo de vida / A moral deles e a nossa. São Paulo: Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2009.
______________. Textos sobre arte, cultura y literatura. Córdoba: Jorge Sarmiento, 2008.


Notas:

1 André Breton, Louis Aragon, Paul Eluárd e Benjamin Péret, em 1922.
2 Ressalta-se que a afirmação realizada não implica em um desmerecimento da obra artística dos surrealistas no mesmo período. Neste, as empreitadas estéticas dos mesmos, centradas na narração dos sonhos, na escrita automática e na destruição da forma romance, bem como intervenções em espaços públicos, expressam seguramente uma grande riqueza de conteúdo. Não se pretende, nesta análise, um debruçar-se sobre as obras, mas, antes, sobre a atuação e posição política do grupo.
3 Exemplo notório desta concepção de mundo que permeava o grupo encontra-se na carta de Antonin Artaud de 8 de janeiro de 1927, que se refere a sua expulsão do grupo surrealista: “Para mim há muitas maneiras de se entender a Revolução e dentre estas maneiras a Comunista me parece de longe a pior, a mais reduzida. Uma revolução de preguiçosos. Não me importa absolutamente, eu o proclamo bem alto, que o poder passe das mãos da burguesia para as do proletariado. Para mim a Revolução não está aí. Ela não está em uma simples transmissão de poderes. (...) Por ora, direi que a Revolução mais urgente a realizar está em uma espécie de regressão no tempo. Que nós voltemos à mentalidade ou simplesmente aos hábitos de vida da Idade Média (...), e julgarei então que nós teremos efetuado a única revolução de que vale a pena que se fale.” (ARTAUD, 2004, p. 39).
4 Periódico que orbitava em torno do Partido Comunista Francês, que assumirá posteriormente tendências oposicionistas.
5 Importa pontuar que nos referimos, neste texto, à ala majoritária dos surrealistas, e daí as generalizações. LOWY (2002) refere-se a três frações consolidadas no seio do movimento surrealista entre os anos de 1925 e 1926: uma primeira, que se assentava predominantemente no aspecto mágico e inconsciente do surrealismo, a ponto mesmo de expressar um niilismo frente ao aspecto político que o movimento começara a esboçar, da qual participava, entre outros, Antonin Artaud e Philipe Soupault (o qual deixará esta fração e se tornará mais politizado); a segunda – que se fundamentava predominantemente em um marxismo de ranço determinista e mecanicista, chegando mesmo a censurar o aspecto amplamente subjetivo preconizado pelo grupo, representado principalmente por Pierre Naville; e o terceiro, que abrangia a maior parte dos surrealistas, que procurava unir o campo objetivo ao subjetivo, afirmando a irmandade existente entre poesia e revolução, como André Breton e Benjamin Péret. As frações não foram, obviamente, estáticas, mas muito dinâmicas, de onde pode provir uma certa confusão em caracterizar tal ou qual artista surrealista, ou de fixá-lo em uma fração até o final de sua vida.
6 Rompe primeiramente com o PCF a ala “dirigente” dos surrealistas então, da qual fazia parte André Breton, Yves Tanguy, René Crevel, Paul Eluárd, Pierre Yoyotte e Pierre Naville, dentre outros. O rompimento em definitivo de quase todo o grupo se dará em junho de 1935, após o Congresso dos escritores em defesa da cultura (FACIOLI, 1985, p.15).

7 “Como não nos preocuparmos terrivelmente com tamanho rebaixamento do nível ideológico de um partido que, não faz muito tempo, saíra tão brilhantemente armado de duas das melhores cabeças do século XIX?!”(BRETON, 2001, p. 172)
8 Alexander Bogdhanov e Nicolai Bukhárin se lançarão à frente do debate com a elaboração dos conceitos de cultura proletária e arte proletária, do primeiro derivado, ambos fundamentados em um raciocínio mecânico de contraposição à cultura burguesa, fundamentados na filosofia empiriomonista de Bogdhanov. Deste modo, o caráter de classe da produção artística caracterizada como burguesa (o que passava, imediatamente, pelas experiências vanguardistas do período) seria contraposto pelo caráter coletivista e propagandístico de uma arte proletária, elaborada por operários e camponeses, que fosse capaz de dar conta de um elogio à classe e da captação de seu espírito revolucionário. Contraditoriamente, a forma pela qual se daria este renovação estética seria, em sua maior parte, pelo resgate formal do realismo e do neo-classicismo do século XIX, ainda que negasse fundamentalmente seus autores, como Balzac e Flaubert, enquanto meros burgueses. Assim, estaria garantida a participação ativa do povo na vida cultural e a negação de todos os “influxos reacionários”, “formalistas”, neste campo.
Francisco Posada atenta para a identidade muitas vezes presente nas teorias estéticas marxistas entre o conservadorismo e uma teoria global da decadência burguesa, pontuando o caráter mecânico que muitas vezes assumem estas ponderações ( nas quais decadência burguesa geraria imediatamente arte decadente). Cf. POSADA, 1970..
Conforme colocou Victor Serge, em 1925: “a tarefa do proletariado na escala da história não tem sido a de criar uma sociedade do proletariado, mas uma sociedade sem classes, na qual a cultura será, não qualificativa e restritiva, mas uma ocupação de todos, de toda a humanidade (Apud GOUJON, 1994, p.196). Importa assinalar, igualmente, que nas elaborações de Marx e Engels sobre o campo cultural está presente o descompasso de tempos entre a política, a economia e a cultura. Desta forma, um autor reacionário politicamente poderia produzir obras revolucionárias objetivamente (como Balzac), bem como uma época histórica de refluxo ou decadência econômica poderiam ser a base para obras artísticas de elevada qualidade (como a Grécia antiga, em seu declínio). Cf. MARX,K;ENGELS,F. __________
10 Em 1929, voltando ao Segundo Manifesto do Surrealismo, André Breton, a par das elaborações trotskianas escreverá, em tom similar: “ (...) tão falso quanto qualquer tentativa de explicação social, excetuada a de Marx, é, para mim, qualquer ensaio de defesa e ilustração de uma literatura e uma arte dita “proletárias”, numa época em que ninguém pode invocar a cultura proletária, pela simples razão de que esta cultura não existe nem mesmo em regime proletário”. (BRETON, 2001, p.187)
11 No conhecido caso em que Naville barra o ingresso do surrealista Benjamin Péret à Liga Comunista Francesa (trotskista) em função de suas atividades artísticas.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A realidade nos exige ser uma juventude revolucionária, combativa e classista


2° Plenária da Juventude às Ruas com ativistas da greve da USP 


Por Iuri Tonello e Ana Carolina Oliveira

Essa é a tarefa que ficou marcada para os mais de 100 estudantes que estiveram presentes na plenária impulsionada pela Juventude Às Ruas com os ativistas da greve da USP, no último domingo, 04/12. Nela estiveram presentes estudantes de São Paulo, da Unesp (Marília, Rio Claro e Franca), Campinas, PUC e USP; do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Paraná.


A partir das discussões e reflexões que se abriram com o conflito de importância nacional que teve na USP, em que os estudantes travaram uma forte e importante campanha pela retirada da PM do campus e pela defesa dos 73 presos políticos no conflito, discutiu-se as lições e perspectivas de como avançar na conformação e consolidação de uma juventude revolucionária que começa a se constituir a partir dos processos reais da luta de classes em que viemos intervindo, buscando atuar dentro das universidades e colégios e se ligar as principais greves, como no último período buscamos fazer apoiando os trabalhadores dos Correios, Bancários, Unicamp etc.



Da USP ao Chile: as intervenções de abertura da plenária!




Nesse sentido, a plenária expressou desde suas intervenções iniciais a experiência da USP a luz da discussão sobre as lições da intervenção nesse processo: Gui, estudante independente da USP, partiu de detalhar os processos que ocorreram durante o conflito no último período, colocando a importância da auto-organização a partir do comando de greve com delegados revogáveis tirados nas assembleias de curso, que tem levado a uma experiência concreta de organização do movimento pela base, ressaltando ainda os entraves que tanto PSOL como PSTU estão colocando em relação a esta política de auto-organização; Caio, estudante independente da USP, relacionou a questão dos conflitos contra a entrada da PM no campus à discussão nacional, em que a polícia atua como agente da repressão estrutural num país dito “Brasil potência”, mas montado na precarização do trabalho e na pobreza urbana. Assim, partiu-se de questionar a polícia no campus para o questionamento do papel da repressão no país inteiro, sendo a mesma polícia que está reprimindo e assassinando a juventude, militarizando a pobreza com ocupações e intervenções militares nos, morros, favelas e periferias. Ainda tivemos a intervenção de Aline, que a partir da discussão da USP, colocou a experiência que tiveram na construção da Chapa Cícera, que leva o nome de uma moradora da favela São Remo, negra e pobre assassinada pela polícia e em sua memória a importância de se construir entidades militantes, que se coloquem na perspectiva de ser a voz das milhares de Cíceras dentro e fora das universidades.


Na abertura, contamos com a presença também para compor a mesa da companheira Bárbara Brito, militante do Partido de los Trabajadores Revolucionários (PTR -organização irmã da LER-QI no Chile). A intervenção de Bárbara se pautou diretamente no debate a partir da rica experiência do movimento estudantil chileno, no qual centenas de milhares de estudantes saíram às ruas para lutar por educação gratuita para todos. A partir da luta chilena, Barbara frisou importantes lições: a primeira é de que a discussão e o combate pela auto-organização foi uma experiência importante para estudantes chilenos (que chegaram a ocupar mais de 600 colégios durante o conflito), podendo tirar lições e fazer experiências concretas de auto-gestão, como o Colégio A-90[1]; Bárbara Brito também relacionou essa questão com a necessidade de se combater a burocracia estudantil (que impede a auto-organização dos estudantes e a expressão da base dentro do movimento) e a necessidade de levar a luta do questionamento da privatização da educação contra os monopólios educacionais e empresários capitalistas que se utilizam da educação para aumentar cada vez mais seus lucros. Que para a juventude levar essa luta até a vitória era necessário se ligar aos trabalhadores, numa forte aliança operário-estudantil para vencer os capitalistas e a privatização da educação.


A parte inicial finalizou-se com a intervenção de Bruno Gilga, militante da LER-QI, que relacionando as lições do processo chileno com as diversas experiências que a juventude vem protagonizando no âmbito internacional, permitiu demonstrar como a luta dos estudantes da USP deve nos aparecer como uma escola de guerra para a construção de uma juventude revolucionária de milhares de jovens, que aprendam com os processos internacionais, intervenha de modo internacionalista nesses processos contribuindo com o avanço das lutas da juventude nos diversos países e possam protagonizar de modo cada vez mais intenso aqui no Brasil um questionamento profundo a universidade de classe, a burocracia acadêmica, ao filtro social que permeia as universidades - vestibular, aos gigantescos monopólios da educação no Brasil e, baseados no processo vigente, ao profundo questionamento dos aparelhos estatais de repressão, como a polícia militar, que vem reprimindo os ativistas e movimentos sociais. “Devemos construir uma juventude revolucionária de milhares, nacionalmente, a partir da fusão com os melhores setores de lutadores que surjam nos processos de mobilização”, reafirmava Gilga.

Aliança com setores do ME nacional, internacional e com trabalhadores!


A plenária também contou com importantes saudações: A companheira Camila, da Universidade Federal de Maringá, contou sobre o processo de ocupação naquela universidade parte de um cenário de ocupações e greves nas universidades pelo país inteiro, da luta que travaram e das lições para a necessidade da unificação do ME nacionalmente nas lutas. Também tivemos importantíssimas saudações de companheiros dos metroviários (que trouxeram a solidariedade à luta da USP, a partir da disputa na categoria em criar um comitê de solidariedade e pela retirada dos inquéritos policiais dos 73 presos políticos); contou também com saudação de companheiros bancários, da agência 7 de Abril, a qual contou com a solidariedade ativa da Juventude Às Ruas nos piquetes e ato na importante greve que tiverem este ano; teve ainda presença e saudação de Marcelo Pablito, diretor do Sintusp, que interviu colocando questões estratégicas de como forjar um sindicalismo realmente revolucionário e, nesse sentido, como enxergar o papel estratégico da juventude e a da aliança operário-estudantil na perspectiva de levar os processos e mobilizações a vitória.. 


A plenária contou também com saudações internacionais da juventude do Partido de los Trabajadores Socialistas - de companheiros também processados por sua aliança com os trabalhadores no conflito da fábrica Kraft, de 2009 - e também a saudação da Liga de Trabajadores por el Socialismo (organizações da Argentina e do México, respectivamente, ambas organizações irmãs da LER-QI), na perspectiva da integração das juventudes desses países na conformação de um movimento estudantil internacionalista.


Com muitas intervenções do plenário, abriu-se um vivo debate das lições da USP, e de todas as universidades presentes. Entramos também em discussões sobre outros processos abertos, como a greve de trabalhadores da UNICAMP, apoiado especialmente pelos estudantes do IFCH-Unicamp e processos de luta como o da moradia de Franca por permanência estudantil e de como a luta contra a polícia é um exemplo do que temos que construir no Rio de Janeiro.


A luta pela retirada dos processos contra os 73 presos políticos da USP, tomou parte em varias intervenções, ressaltando a importância da centralidade deste eixo em um momento onde assistimos uma investida contra o conjunto dos movimentos sociais em todo território nacional. Nesta linha, coube a denúncia a política  do PSOL e PSTU que seguem a dar nenhum peso para esta campanha, tentando desviar o debate para a questão da segurança do campus, caindo em um debate corporativo, sem questionar as raízes da repressão estatal e o papel que cumpre diariamente a PM no extermínio da juventude negra e pobre das periferias, morros e favelas.


Entre os diversos debates, chamamos a atenção para a rica discussão na plenária acerca da reivindicação do marxismo na conformação da juventude: com bastante debate, a plenária expressou diversos setores interessados em ligar as discussões sobre teoria revolucionária com os processos concretos de atuação. 


Nesse sentido, votamos a construção de um seminário de férias com o objetivo de levar adiante e aprofundar as discussões que se abriram sobre o marxismo e outras tradições teóricas do movimento operário. As lições que se pode tirar dos grandes processos revolucionários do século XX são uma condição para preparar uma juventude revolucionária à altura dos desafios do nosso tempo, e nessa perspectiva pretendemos aprofundar os debates sobre teoria revolucionária da plenária.

Uma juventude com uma estratégia revolucionária em meio a crise capitalista!

Fica cada vez mais clara a necessidade de superarmos, a partir dos processos em curso, a velha lógica de construção das burocracias de juventudes voltadas para eleições e aparatos: é necessário que construamos uma juventude que rompa com a conciliação e a passividade, construindo luta pelo questionamento da universidade de classe, elitista e racista, aprofundando o conteúdo estratégico da auto-organização e da luta contra a burocracia: isso se expressa de modo muito concreto na continuidade da luta na USP pela retirada da PM do campus e a retirada dos inquéritos contra os presos políticos, além dos diversos processos contra ativistas que vem sendo perseguidos pela reitoria, aprofundando o comando de greve e preparando uma forte juventude revolucionária para atuar desde as calouradas nas universidades e colégios no início de 2012.

Nos marcos da crise econômica internacional e na ofensiva de ataques da burguesia para fazer com que a classe trabalhadora e a juventude paguem pela crise, queremos ser parte viva e linha de frente da juventude estudantil e proletária que se espelha nos exemplos mais avançados internacionalmente, como dos estudantes chilenos e que se prepara para fazer diferença na luta de classes ao lado dos trabalhadores.


A experiência nos processos iniciais de luta de classes, a partir da forte discussão em base a luta contra a PM na USP, nos leva a tarefa de criar uma juventude que relacione cada luta parcial sua numa perspectiva anticapitalista, pois sabemos que o capitalismo numa crise histórica não pode fornecer mais que miséria, pobreza e exploração. A juventude anseia pelo seu futuro: está realidade nos impõe nos forjarmos como uma juventude classista, combativa, internacionalista e revolucionária e queremos também aqui no Brasil, assim como no Chile, conformar uma “Juventude que vai por tudo”!

Chamamos a todxs a conhecer e construir a Juventude Às Ruas!